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Plantas de cobertura no manejo integrado de plantas daninhas nas terras baixas do Sul do Brasil

Introdução

Os sistemas agrícolas se intensificaram nas últimas décadas através do desenvolvimento de novas tecnologias e implementos que tornaram a implantação, estabelecimento e proteção de diversos cultivos mais fácil em todo o mundo e nas terras baixas não foi diferente. A orizicultura gaúcha, nos últimos vinte anos é um belo exemplo disso: disponibilização de cultivares com alto potencial produtivo, novas estratégias de irrigação, correção do micro-relevo do solo e evolução na preocupação da demanda nutricional de plantas. A disponibilização de herbicidas seletivos para a cultura, aliada ao controle precoce de plantas daninhas e entrada da água de irrigação, são pontos importantes pelo salto de produtividade observado nos últimos 20 anos.

A possibilidade de eliminar plantas daninhas de difícil controle como o capim-arroz (complexo Echinochloa) e o arroz-daninho (Oryza sativa) das lavouras com apenas um produto é incrível, contudo, o uso intensivo de única tecnologia, cedo ou tarde, permitirá que problemas possam surgir. Atualmente plantas daninhas resistentes a herbicidas estão presentes em muitas lavouras de arroz no Rio Grande do Sul, indicando que o “remédio de alívio imediato”, tornou-se faca de dois gumes.

Assim, passamos a cultivar a soja no ambiente de terras baixas, de olho no fator financeiro, mas também, visando rotacionar mecanismos de ação e controlar estas plantas resistentes aos herbicidas utilizados no arroz irrigado. Mas até quando essa será a melhor solução? É um grande passo inicial, porém, diante da demanda das autoridades e da sociedade por uma agricultura mais sustentável, devemos adotar também outros pilares do que conhecemos por Manejo Integrado de Plantas Daninhas.

Figura 1. Modelo esquemático do Manejo Integrado de Plantas Daninhas. Adaptado de: University of Wisconsy-Madison - Extension and Research, 1960.


O Manejo Integrado de Plantas Daninhas baseia-se no conhecimento do banco de sementes, na identificação das espécies, das plantas resistentes a herbicidas, e na prevenção da entrada de novas espécies problema na área. Ainda, preconiza a adoção simultânea de ao menos dois dos cinco métodos de controle. Exemplos de métodos físicos de controle são as queimadas, a dessecação elétrica e a lâmina d’água utilizada na cultura do arroz irrigado. Os métodos mecânicos de controle incluem roçadas, arranquio manual e as operações de preparo do solo. No caso do controle biológico organismos como bactérias, fungos, insetos e animais são utilizados para suprimir o crescimento das plantas daninhas. Já o controle cultural visa adoção de qualquer prática que favoreça a cultura de interesse em detrimento das plantas daninhas, incluindo o cultivo de coberturas de inverno ou pastagens visando produção de carne ou leite.


IRRIGAÇÃO E O MANEJO D’ÁGUA NA LAVOURA DE ARROZ

Como citado anteriormente, a irrigação por inundação se caracteriza como um método físico de manejo de plantas daninhas, já que a lâmina d’água estabelecida impede a emergência de novos fluxos, além de interferir no metabolismo de plantas já estabelecidas, ao eliminar todo o oxigênio disponível às sementes e raízes das plantas daninhas. O manejo da irrigação também propicia ambiente favorável à cultura e, normalmente complementa o efeito dos herbicidas na supressão das plantas daninhas, potencializando a eficiência de alguns herbicidas, também pela maior solubilização destes no solo.


Nas últimas duas safras estudos realizados na Embrapa também comprovaram a velha máxima: “O melhor herbicida para a cultura do arroz é a água”. Independente do herbicida utilizado, quanto antes é iniciada a irrigação e estabelecida a lâmina d’água melhor é o controle de capim-arroz. Na safra 2018/19, quando a irrigação da área ocorreu aos 3 dias após a aplicação dos herbicidas pós-emergentes (3 DAH), foi obtido 92,9% de controle de capim-arroz, enquanto atrasando em oito dias em relação ao início desta (11 DAH) o controle situou-se em 87,1%, sofrendo assim redução de 6%. Na safra 2019/20, os resultados foram semelhantes e reforçam o importante papel do manejo d’água. O controle obtido este ano, com o início da irrigação aos 3 DAH foi de 95,5%, enquanto com o atraso de oito dias (11 DAA), houve uma perda de 15,3%, proporcionando apenas 79,9% de controle de capim-arroz.

Por tanto, utilizar tecnologias que otimizem e acelerem o processo de condução, distribuição e irrigação na lavoura de arroz é de extrema importância visto que é um fator determinante para a performance de herbicidas pós-emergentes, além de potencializar a produtividade da cultura e maximizar a rentabilidade da atividade.

Figura 2. Controle de capim-arroz em função de épocas de início da irrigação.


CULTIVOS DE INVERNO NAS TERRAS BAIXAS NO SUL DO BRASIL

Nas terras baixas, cultivos de inverno clássicos, como trigo e aveia, não são adaptados às classes de solo e ao clima chuvoso e úmido do inverno comuns nestas áreas. Contudo, existem espécies adaptadas a estes ambientes que podem ser cultivadas agregando diversos benefícios ao sistema de produção e contribuindo para o manejo integrado de plantas daninhas, visto que após o final do ciclo desta, através de estratégia química ou mecânica, o solo permanece coberto restringindo a emergência de plantas daninhas. Além disso, algumas culturas de inverno podem ser integradas à produção pecuária, tradicional atividade do Rio Grande do Sul, sendo utilizadas como forrageiras, o que diversifica ou amplia a fonte de renda das propriedades. Além disso, a presença do animal pastejando sobre estas áreas produz outro efeito benéfico, que é o aumento na ciclagem dos nutrientes do solo, aumentando a disponibilidade de nutrientes para a cultura subsequente. A seguir apresentamos algumas das espécies que estão cultivadas em nossa área experimental, com alguns possíveis benefícios.


Azevém (Lolium multiflorum): uma das espécies mais adaptadas ao ambiente encontrado nas terras baixas do Sul do Brasil. A adoção pelos produtores é alta devido sua alta produção de forragem e simplicidade de manejo, estando restrita praticamente à adubação nitrogenada e ajuste de carga de pastejo, o que permite o pastoreio de gado de corte ou leite. Devido a adequado desenvolvimento nestes ambientes, e ótima cobertura do solo (Foto 1), o azevém impede o estabelecimento de algumas espécies que necessitam estímulo luminoso para germinar, como a buva por exemplo. Ainda, apresenta papel importante na ciclagem do potássio.

Figura 3. Azevém semeado na caída da folha da soja e já estabelecido antes da colheita da leguminosa, aumentando o período potencial de pastejo.


Trevo-branco (Trifolium repens): das espécies de trevo utilizadas em terras baixas, é a mais adaptada. Apesar de apresentar estabelecimento lento no primeiro ano, proporciona um grande volume de forragem e consequentemente cobertura do solo. Um dos principais benefícios é a fixação biológica de nitrogênio, além do elevado valor nutritivo para a produção animal.


Trevo-persa (Trifolium resupinatum): adaptada as condições de umidade das terras baixas, estabelecimento mais rápido que o trevo-branco e proporciona alto volume de forragem e cobertura do solo, além de fixar biologicamente nitrogênio. A adoção desta espécie é crescente na Zona Sul do Rio Grande do Sul.


Trevo-vermelho (Trifolium pratensis): menos adaptada ao ambiente de terras baixas, porém, com estabelecimento mais rápido que o trevo-branco. Assim como as outras espécies de trevos, também apresenta a capacidade de fixar nitrogênio.


Cornichão (Lotus corniculatus): adaptada ao ambiente de terras baixas é amplamente cultivado no Uruguai e Argentina. O estabelecimento inicial é mais rápido que o do trevo-branco, desde que as condições sejam favoráveis. Produz alta massa de forragem e também fixa nitrogênio biologicamente.


Figura 4. Plântulas de opções leguminosas forrageiras de inverno presentes em estudos na Estação Experimental Terras Baixas.


Ervilhaca (Vicia sativa): espécie que não é adaptada ao ambiente de terras baixas e portanto, é uma opção arriscada. É necessário manter as áreas muito bem drenadas. Contudo, apresenta estabelecimento rápido e fixação biológica de nitrogênio. Seu cultivo é muito comum no Uruguai e Argentina como forrageira consorciada a gramíneas.


Nabo-forrageiro (Raphanus sativum): trata-se de uma espécie pertencente a família Brassicaceae com estabelecimento e desenvolvimento rápido e com crescimento radicular agressivo graças a sua raiz pivotante, podendo ser utilizada como opção de descompactação verde. Com não é adaptada às terras baixas, exige boa drenagem, podendo ser também uma opção para pastejo de animais, contribuindo para a ciclagem de nutrientes.


Canola (Brassica napus): assim como o nabo-forrageiro pertence a família Brassicaceae, contudo, não apresenta o mesmo potencial radicular. Apesar de não ser adaptada ao ambiente de terras baixas, pode se tornar uma opção de produção de grãos durante o inverno.


Figura 3. Nabo-forrageiro e canola estabelecidos em estudos na Estação Experimental Terras Baixas.


Trigo duplo propósito - BRS Tarumã: opção para produção de forragem e grãos, que deve ser semeada mais cedo que outras cultivares de trigo, garantindo a cobertura do solo durante todo o inverno. Não é adaptada ao ambiente de terras baixas, contudo, desde que seja estabelecida em área com sistema de drenagem adequado, pode ser utilizado.


Aveia-preta BRS 139 Neblina: mais uma opção forrageira, indicada para a cobertura do solo e plantio direto. Assim como o trigo não é adaptada às condições úmidas das terras baixas, mas pela precocidade em relação ao azevém pode antecipar a disponibilidade de forragem aos animais.


CONDIÇÕES DE IMPLANTAÇÃO:

Dentre os fatores mais importantes para a implantação de qualquer cultura de cobertura/pastagem de inverno após o cultivo de arroz irrigado, o manejo pós-colheita é decisivo. Esta prática permite que o cultivo de inverno seja implantado em solo drenado e rapidamente “ocupe” o solo. É fundamental adequar todo o sistema de drenagem para evitar eventos de alagamento por mais de 24h, o que é fator limitante para o desenvolvimento de algumas das espécies comentadas anteriormente. Com o preparo antecipado visando o cultivo de inverno, o solo estará pronto para a semeadura da cultura de verão sucessora dentro da época recomendada. Dessa forma, os restos culturais da cobertura de inverno contribuirão para a supressão de plantas daninhas durante o estabelecimento inicial da cultura de verão. Porém, na sucessão de áreas pós cultivo de soja, o estabelecimento das espécies de inverno pode ser antecipado para a pré-colheita, que irão se beneficiar de questões relacionadas ao sistema de drenagem já estabelecido anteriormente para a soja e também da ciclagem de nutrientes. Importante destacar que os avanços recentes obtidos em culturas de inverno, sempre estão associados a correção física e química do solo, que são condições indispensáveis/obrigatórias para o sucesso do sistema.

Deve-se atentar para o excesso de palhada de algumas espécies de inverno, principalmente do azevém mal manejado, que pode dificultar seja o processo de semeadura, como de estabelecimento de arroz ou soja se ocorrer excesso de chuvas pós-semeadura. O excesso de umidade retido no solo, pode impedir que o mecanismo “tapador” da semeadeira proporcione adequada cobertura do sulco de semeadura. Por outro lado, o excesso de palha, associado a baixos volumes de chuva, pode reduzir a eficiência de herbicidas pré-emergentes com alta lipofilicidade, que ficarão retidos na palha, não alcançando o solo e por consequência, com reduzida ação em sementes de plantas daninhas.


ESTAÇÃO EXPERIMENTAL TERRAS BAIXAS – EMBRAPA CLIMA TEMPERADO

Desde o ano de 2014, a equipe de pesquisadores e estudantes da Embrapa e UFPel, atua na realização de estudos na Estação Experimental Terras Baixas da Embrapa, abordando a relação arroz/azevém/soja, visando ampliar conhecimento para a integração lavoura-pecuária, de forma a quantificar diversas estratégias de enfrentamento às plantas daninhas e ao mesmo tempo ampliar a produção, seja de grãos, carne ou leite nos 12 meses do ano. Esses trabalhos têm demonstrado a capacidade de gerar ganhos econômicos e ambientais muito significativos para os sistemas de terras baixas, sobretudo na metade Sul do RS.


A transferência de tecnologia gerada ou estudada nestes ambientes são disponibilizadas também em dias-de-campo, palestras, publicações em revistas especializadas ou sites com interesse agrícola, além das plataformas digitais como o instagram (@herbologiatb).

Autores:

Matheus Bastos Martins – Doutorando do PPGFitossanidade - UFPel.

André Andres, Pesquisador Embrapa

Jorge Schafhauser Junior, Pesquisador Embrapa

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